Uma intuição antiga, hoje plenamente confirmada, leva-me a crer que a política é sobretudo Estética para os portugueses. A tradição do poeta-político mantém-se (seguindo Antera de Quental, Teixeira de Pascoaes ou Almeida Garrett, conforme a casa política), e a esmagadora maioria da elite política (aquela que comenta ou faz política), guia-se mais por critérios estéticos do que racionais, o que explica em larga parte a dissonância cognitiva patente no debate político português.
A Estética, contrariamente aos assuntos científicos, não exige sistema nem coerência da parte do sujeito. Pode-se simpatizar com o Belo de dia para escrever sonetos do Abjecto à noite, nada que a complexidade sensitiva humana não comporte. Aderir a ideias políticas por motivos estéticos tem outro desfecho.
Não se pode, sem incoerência, defender um Estado que não se intrometa nas vidas privadas para depois defender a conservação de privilégios sociais; Não se pode, sem incoerência, criticar o socialismo para depois defender a necessidade de um gestor Forte das vidas públicas; Não se pode, sem incoerência, ser contra a intromissão do Estado na economia para de seguida defender que impostos sociais devam ser cobrados; Não se pode, sem incoerência, defender a liberdade individual para depois advogar a inocuidade do uso de força ilegítimo por parte do Estado. A lista poderia continuar e tocar todos os quadrantes políticos com expressão em Portugal.
O erro consiste em falhar em reconhecer quais os princípios morais adjacentes a ideias defendidas, sendo que é precisamente dos princípios morais que depende a construção de um sistema coerente de ideias. Aderir a ideias por motivos estéticos não só revela insensibilidade ética como permite que uma mesma pessoa defenda ideias contraditórias entre si, ideias às quais aderiu por questões emocionais, pelo prazer intelectual ou sentimental que lhe causam. Num contexto destes, o uso emocionado de bandeiras é frequente. Ser conservador ou liberal em Portugal resume-se a um combate vazio entre duas escolas estéticas. E o referente dos próprios conceitos de conservadorismo e liberalismo muda como os conceitos de belo ou sublime consoante a escola de pintura.
A aplicação na sociedade de tal mistela de ideias pode apenas dar em tragédia, o que, ironicamente, faz assim regressar a política portuguesa ao seu berço estético.