"A economia de casino está longe de ter sido ultrapassada (...). E, sem isso, não será possível ultrapassar a crise." Mário Soares, "Diário de Notícias", 29-9-2009
O pior das recorrentes bolhas seguidas de crises financeiras é a facilidade com que se atribui culpas ao suposto capitalismo financeiro. Mas a realidade é outra: Os Bancos Centrais por natureza estimulam o crédito por pura criação de moeda em vez transferência de poupança prévia e voluntária de aforradores para investidores (e hoje em dia, até consumidores a crédito).
A "economia de casino" (vamos definir como: bolhas de preços fomentadas artificialmente por crédito dando lugar a especulação não sustentada) a existir subsiste só pela crendice (académica e política: é uma relação de simbiose) que o crédito barato (barato por puro intervencionismo, dado que num sistema livre, todo o crédito monetário teria de resultar do acto consciente de poupança prévia monetária e isso conduziria a taxas de juro reais mais elevadas) do que assim resulta é positivo para o investimento, o que demonstra bem a disfunção cognitiva que é falar-se sempre de "crédito versus investimento" em vez de "poupança versus investimento" como se o crédito fosse uma variável independente.
Com o facilitismo do crédito que assim tem lugar, nascem as bolhas (mais visíveis nos preços imobiliários, ou acções, ou de matérias -primas, etc..). Pelo caminho tem lugar o chamado "efeito Cantillon" (economista, 1680 - 1734) onde os primeiros recebedores das novas quantidades de dinheiro (sob a forma de novo crédito) são beneficiados em relação ao resto da economia por poderem gastar essa nova moeda ainda antes de esta se adaptar com preços relativos mais altos. É um certo efeito que apenas por instinto autores de esquerda articulam de forma desordenada sem conhecer as causas mas que um liberal deve identificar sem pudor: um certo complexo financeiro-industrial que beneficia por estar mais perto da fonte de novas quantidades de moeda e crédito que não resultam de pagar a taxa de juro natural (uma que resultaria de um sistema monetário livre) aos aforradores.
A raiz do problema:
Todos sabemos que os Bancos têm a quase totalidade dos depósitos à ordem concedidos a crédito ou investidos. O que faz com que qualquer movimento de pedidos de transferência ou levantamentos em maior valor se transforme em insolvência de parte do sistema bancário (primeiro um banco, depois os outros).
Esta disfunção jurídica e económica onde se quer que por um lado moeda seja moeda (um meio de pagamento imediato) e por outro seja crédito é a prova que o actual sistema monetário é insolvente por natureza e apenas devido aos ... Reguladores.
Além disso, no acto de expansão por concessão de crédito, os bancos limitam-se a creditar a conta de depósitos à ordem do novo credor, criando assim moeda, em vez de transferir poupança monetária de aforradores.
Este simples facto providencia:
- taxas de juro mais baixas que a taxa "natural"
- a ilusão de poupança que não existe
- a ilusão da sustentabilidade do investimento em curso
Dando assim lugar ao erro económico generalizado (como sempre acontece quando a função de informação providenciada pelos preços relativos é deturpada).
Quando a bolha rebenta, toda moeda criada no acto de concessão de crédito que induziu a ilusão de prosperidade e sustentabilidade do investimento em curso (real, acções, imobiliário, etc.) transforma-se em má moeda porque o crédito concedido passa a mal parado, e os bancos deixam de deter reservas de moeda suficientes para fazer face a movimentos de depósitos à ordem o que conduz a corridas aos bancos.
Dá-se assim o acto perfeitamente racional e justificado de depositantes a querer transformar os seus depósitos à ordem de má qualidade em moeda.
Depois surgem os economistas e políticos a atribuir culpa ... à economia de casino, à maior poupança e falta de investimento privado a ao fenómeno que apelidam de "armadilha de liquidez" trocando por completo causas com consequências e propõem:
- injecções massivas de ainda mais moeda e crédito
- aumento da despesa e investimento público para se substituir à queda do investimento privado
Mas a crise quando tem lugar é na verdade o processo de cura da doença caracterizada por excessos e ilusões.
Nota: para bibliografia do ponto vista da Escola Austríaca (Mises, Hayek, Rothbard e muitos outros) ver aqui.